sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

criatura

um ferro em brasa deixou-me marca indecifrável no ombro. antes que pudesse protestar duas garras enormes me levantaram, como a uma presa já ferida e pouco combativa. quando passei pelas nuvens, tinha-me habituado à altitude sempre crescente. quando levo a mão aos ombros, no lugar que as garras perfuraram, não encontro nada. foi-se o predador, antes de o ser. e, sobressaltado, apercebo-me que nada me impedirá de cair. com naturalidade lembro-me de bater asas, de imaginar asas, de rezar por asas. de, aflito, bater os braços como se fosse pássaro levantando voo. mas eu era homem perdendo distância do chão. caí, como uma seta cada vez mais apressada, como um fruto dos céus, demasiado longe da maturação. caí, vertiginoso e grave. e mesmo antes de sentir o chão atravessando-me os ossos, abri os olhos e levantei-me da cama, ofegante.

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