Meu irmão,
Sinto que se aproximam ventos de mudança. Há grande rebuliço nas ruas, tudo é agitação. Duas novas caravelas estão quase prontas e ultimam-se os preparativos que serão costumeiros por estas alturas. Não consigo dormir as horas que o corpo me pede. Tenho sonhado com mulheres que se oferecem em preparos de indecência e luxúria, demónios em forma de mulher que me cantam como sereias e me enlaçam como feras de luxo e tentação. A bestialidade dos meus sonhos tem continuidade nos monstros cuspindo fogo que saem da água como heresias abomináveis; o barco é quase sempre desfeito por tais abominações como uma folha seca nas mãos de uma criança.
Não te quero encher o pensamento de tais figuras, irmão querido. É de resto durante o dia que mais se exalta a minha imaginação. Não de demoníacas tentações ou de bestas invencíveis. O que me ocupa a inteligência é a dúvida. Serão necessários mais homens, que compensem a falta de experiência do mar com a grande elevação da sua coragem? Virá alguém a terra, a mando dos capitães, buscar homens de trabalho e empenho?
Decerto adivinhas a minha decisão, meu irmão e filho da nossa mãe adorada que Deus chamou a si. Já nada me impede a determinação de partir. Nada de mundano me prende a esta cidade, a este Portugal de miséria e de fome. Buscarei a abundância, a riqueza, ou ao menos algo de novo que me alegre a alma. Nunca bateu tão desdemido o meu coração, irmão da minha alma. Sei que sopra forte o vento lá onde não se vê terra nem esperança. E que se levantam as ondas como montanhas, perante o medo dos homens. Ouço as histórias que se contam, nas noites de muitos copos. E digo-te que mesmo que apenas um pouco do que se conta seja verdadeiro, ainda assim é de temer o que o mar e o céu produzem.
Não sei se estas missivas que te dão conta da saúde do meu corpo e da minha alma se irão interromper. Ainda que me custe privar-te das minhas palavras, anseio por hora em que te escreva em alto mar, sem saber quando poderei endereçar-te os meus pensamentos.
Sempre rezando por ti,
te encomendo a Deus,
Afonso.
Sinto que se aproximam ventos de mudança. Há grande rebuliço nas ruas, tudo é agitação. Duas novas caravelas estão quase prontas e ultimam-se os preparativos que serão costumeiros por estas alturas. Não consigo dormir as horas que o corpo me pede. Tenho sonhado com mulheres que se oferecem em preparos de indecência e luxúria, demónios em forma de mulher que me cantam como sereias e me enlaçam como feras de luxo e tentação. A bestialidade dos meus sonhos tem continuidade nos monstros cuspindo fogo que saem da água como heresias abomináveis; o barco é quase sempre desfeito por tais abominações como uma folha seca nas mãos de uma criança.
Não te quero encher o pensamento de tais figuras, irmão querido. É de resto durante o dia que mais se exalta a minha imaginação. Não de demoníacas tentações ou de bestas invencíveis. O que me ocupa a inteligência é a dúvida. Serão necessários mais homens, que compensem a falta de experiência do mar com a grande elevação da sua coragem? Virá alguém a terra, a mando dos capitães, buscar homens de trabalho e empenho?
Decerto adivinhas a minha decisão, meu irmão e filho da nossa mãe adorada que Deus chamou a si. Já nada me impede a determinação de partir. Nada de mundano me prende a esta cidade, a este Portugal de miséria e de fome. Buscarei a abundância, a riqueza, ou ao menos algo de novo que me alegre a alma. Nunca bateu tão desdemido o meu coração, irmão da minha alma. Sei que sopra forte o vento lá onde não se vê terra nem esperança. E que se levantam as ondas como montanhas, perante o medo dos homens. Ouço as histórias que se contam, nas noites de muitos copos. E digo-te que mesmo que apenas um pouco do que se conta seja verdadeiro, ainda assim é de temer o que o mar e o céu produzem.
Não sei se estas missivas que te dão conta da saúde do meu corpo e da minha alma se irão interromper. Ainda que me custe privar-te das minhas palavras, anseio por hora em que te escreva em alto mar, sem saber quando poderei endereçar-te os meus pensamentos.
Sempre rezando por ti,
te encomendo a Deus,
Afonso.
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